Com o nome de “Antiprincesas“, a colecção da editora Tinta da China, conta com quatro títulos. O primeiro deles conta a história da artista Frida Kahlo, o segundo foi dedicado à chilena Violeta Parra, o terceiro à boliviana e militar Juana Azurduy e o último à escritora Clarice Lispector.
Na contracapa de cada livro podemos ler:
“As antiprincesas não são do contra só porque sim: não se resignam, e lutam para fazer valer aquilo que pensam. Como não usam tiaras, podem virar tudo de pernas para o ar e arriscar o que bem lhes apetece, como por exemplo mudar o mundo. Mesmo não tendo superpoderes, as antiprincesas são superpoderosas e sabem que a história é feita pelas mulheres reais. “
Esta colecção surge com a intenção de inspirar as meninas e mostrar que elas podem ser muito mais do que princesas. Estas “antiprincesas” são contra a passividade e a submissão; inspirando meninas a serem as protagonistas das suas próprias vidas gozando da liberdade que é poder escolher o seu próprio caminho.
Há certamente quem se vá insurgir, achando que uma ou outra destas antiprincesas não foram bem escolhidas. A esses digo que, tal como qualquer outra mulher, estas mulheres não eram perfeitas. Eram mulheres reais. Perfeitas são as princesas da Disney e não é isso que se pretende nesta colecção. Que as nossas meninas queiram ser todos os dias melhores do que no dia anterior acho fantástico, mas que não pretendam ser super-mulheres ou viverão frustradas a vida inteira.
Se me perguntassem que mulher gostaria de ver retratada nesta colecção, eu responderia sem pestanejar, Madre Teresa de Calcutá.
Destas quatro, a minha preferida é a Juana Azurduy. Nunca tinha ouvido falar dela nem dos seus feitos e fiquei encantada.
Recomendo para adultos e maiores de 10 anos.
Frida Kahlo
Foi uma importante pintora mexicana do século XX. É considerada, por alguns especialistas em artes plásticas, uma artista que fez parte do Surrealismo. Porém, a própria Frida negava que era surrealista, pois dizia que não pintava sonhos, mas sim a sua própria realidade. Destacou-se ao defender o resgate à cultura dos astecas como forma de oposição ao sistema imperialista cultural europeu.
Frida teve uma vida de muito sofrimento. Uma doença na infância fez com que a sua perna direita crescesse menos do que a esquerda. Um acidente que a deixou na cama durante longos meses e a obrigou a muitas cirurgias. Um relacionamento doentio com o marido, com amantes e violência. Consumo abusivo de álcool, principalmente depois do divórcio. Impossibilidade de ter filhos e três abortos.
No livro não fala no álcool, já no que diz respeito à relação com o marido, cito: “Diego e Frida casaram-se não uma, mas duas vezes. Apesar disso tiveram outros amores, mesmo vivendo juntos. Como noutras coisas, o sentimento amoroso foi mais partilhado do que era costume naquela época. Os amigos e amantes eram muitos, e para Frida o amor tanto de refletia em homens como em mulheres”
Violeta Parra
Viajou pelos lugares mais remotos do Chile a fazer uma recolha de canções tradicionais e assim as salvou do esquecimento. Era autodidacta, aprendendo sozinha a tocar vários instrumentos, a pintar e a bordar. Aprendeu a tocar guitarra sozinha e em segredo com a guitarra do pai.
Proveniente de uma família humilde, com a mãe costureira e o pai professor, ambos com gosto pela música folclórica.
Casou duas vezes e teve quatro filhos.
Fez programas na radio, gravou discos, ganhou prémios, fundou um museu e foi a primeira artista latino-americana a ter uma exposição individual no Louvre.
“Fez-se um grande silêncio. Apesar de não compreenderem aquela língua, as pessoas comoveram-se com a voz profunda que lhes falava de um país distante: ela era a voz dos pobres, das lavadeiras, das apanhadeiras de fruta, dos mineiros, dos artistas de rua…
A atuação de Violeta comoveu de tal maneira as pessoas daquele país frio, que no dia seguinte, enquanto ela caminhava pelas ruas, lançaram-lhe flores das varandas.”
Teve um final trágico. Suicidou-se. No entanto, no livro, somos poupados a esta informação.
Juana Azurduy
Ao aperceber-se da vida difícil e injusta do povo da Bolívia, não conseguiu ficar indiferente. Juntamente com o marido, Manuel Padilla, enfrentou a cavalo muitas batalhas pela libertação da América do Sul.
De saia branca, casaco vermelho, com os filhos nos braços e seguida por outras amazonas, tornou-se guerreira muito antes de serem admitidas mulheres no exército.
“O que mais chamava a atenção dos realistas era uma mulher garbosa e de gentil presença que montava um cavalo brioso e percorria as ruas armada de pistolas e espada. Parecia chefiar as turbas invasoras, que a seguiam com um entusiasmo atroador e delirante. Desafiava a morte com indiferença, avançando bem perto das bocas dos canhões”
“Ao ver que a filha corria perigo de vida, rugiu com força, derrubou o chefe com um só golpe e falou aos outros em quéchua. Eles ficaram especados a vê-la apertar a filha contra o peito, saltar para o cavalo e lançar-se às águas revoltas do rio.”
Morreu velhinha, na casa onde vivia com uma das filhas, a neta e um menino que tinha a seu cargo. O funeral foi humilde, não teve as honras que uma heroína merecia.
Clarice Lispector
Nasceu na Ucrânia numa família de judeus. Devido à perseguição religiosa de que eram alvo mudaram-se para o Brasil.
Jornalista e escritora, escreveu romances, contos e crónicas. Considerava-se uma anti-escritora porque, ao contrário dos grandes escritores que gostavam da solidão e isolamento para escrever, Clarice fazia questão de manter uma vida activa e por isso escrevia com a máquina de escrever no colo e os filhos a brincarem à sua volta.
Teve uma vida de luxo na Europa com o marido, um diplomata, mas nunca se identificou com aquele tipo de vida e acabou por abandonar a vida de princesa para voltar ao seu tão amado Brasil onde viveu junto ao mar até ao fim da sua vida.
Dizia sempre o que pensava e o que sentia.
“Sou uma mulher que escreve, porque para mim escrever é como respirar, necessário para sobreviver. Talvez por causa disso não goste de falar sobre os meus livros. O que eu tinha de dizer está neles. Acredito na interpretação de cada leitor. Sou como uma mãe animal. Os livros são as minhas crias, esqueço-me depressa deles. Não reconsidero, não analiso, não fomento em mim orgulhos falsos.”